Fonte CEPEA
Milho - Indicador Campinas (SP)R$ 69,27 / kg
Soja - Indicador PRR$ 136,24 / kg
Soja - Indicador Porto de Paranaguá (PR)R$ 142,51 / kg
Suíno Carcaça - Regional Grande São Paulo (SP)R$ 12,86 / kg
Suíno - Estadual SPR$ 8,82 / kg
Suíno - Estadual MGR$ 8,45 / kg
Suíno - Estadual PRR$ 8,25 / kg
Suíno - Estadual SCR$ 8,30 / kg
Suíno - Estadual RSR$ 8,28 / kg
Ovo Branco - Regional Grande São Paulo (SP)R$ 126,60 / cx
Ovo Branco - Regional BrancoR$ 129,10 / cx
Ovo Vermelho - Regional Grande São Paulo (SP)R$ 137,99 / cx
Ovo Vermelho - Regional VermelhoR$ 139,58 / cx
Ovo Branco - Regional Bastos (SP)R$ 118,77 / cx
Ovo Vermelho - Regional Bastos (SP)R$ 131,70 / cx
Frango - Indicador SPR$ 8,09 / kg
Frango - Indicador SPR$ 8,10 / kg
Trigo Atacado - Regional PRR$ 1.184,42 / t
Trigo Atacado - Regional RSR$ 1.029,54 / t
Ovo Vermelho - Regional VermelhoR$ 133,45 / cx
Ovo Branco - Regional Santa Maria do Jetibá (ES)R$ 124,25 / cx
Ovo Branco - Regional Recife (PE)R$ 122,74 / cx
Ovo Vermelho - Regional Recife (PE)R$ 145,37 / cx

Catástrofes Naturais

Enchente de 2024 ainda castiga o agro do RS

Enchente de 2024 ainda castiga o agro do RS

Quem passa pelas plantações de milho ao longo do Vale do Rio Taquari, no Rio Grande do Sul, pode até não perceber que a região sofreu, há um ano, uma das maiores catástrofes naturais da história do Brasil. No entanto, o cenário bucólico revela, em diversos pontos, os efeitos das enchentes, que afetaram 478 dos 497 municípios do Estado, causaram 184 mortes e deixaram 25 pessoas desaparecidas, segundo a Defesa Civil.

Os prejuízos nas cidades que decretaram situação de emergência ou estado de calamidade foram de R$ 13,1 bilhões, de acordo com a Confederação Nacional de Municípios. Desse total, R$ 5,3 bilhões foram perdas na agropecuária. Segundo a Emater-RS, empresa pública de extensão rural, 206 mil famílias de agricultores sofreram com as cheias.

No Vale do Taquari, casas destruídas, galpões e outras estruturas derrubadas, além de árvores e postes arrancados, são as principais marcas físicas que as inundações deixaram. Para quem mora no campo, além dos traumas causados pela tragédia, outras consequências também ficaram: solos inutilizados, perda de animais, dívidas e diversas dificuldades que geram dúvidas em muitos produtores sobre o futuro da atividade agrícola na região.

Mudança geográfica

No Vale do Taquari, uma das cidades que sofreram foi Roca Sales, onde as cheias mataram 17 pessoas. A inundação de maio de 2024 também foi a terceira enchente que o município sofreu em menos de um ano. Antes, as águas do Rio Taquari já haviam causado devastações em setembro e novembro de 2023.

No interior de Roca Sales, na localidade de Linha Bento Gonçalves, 12 famílias moravam às margens do rio. Hoje, depois de três enchentes, nenhuma está no local: as que não foram embora transferiram as moradias para terrenos próximos, em pontos mais elevados.

O produtor Lourenço Caneppele está construindo casas e galpão em uma terra mais alta, a dois quilômetros de distância de sua antiga moradia, que ele tinha comprado pouco antes da enchente de setembro. “As terras mais próximas ao rio eram as mais valiosas porque eram mais férteis. Agora, está tudo ao contrário. Ninguém quer comprar perto da água, e terrenos elevados valem muito”, afirma.

Contando perdas

Os Caneppele têm 29 hectares de terra própria e arrendam 101 hectares. A família também criava suínos e gado leiteiro e de corte, animais que morreram por ação das águas. Nas três enchentes, eles perderam duas casas, estruturas como galpões, pocilgas, estábulos, máquinas agrícolas e insumos. Além disso, parte dos solos ficou coberta de lodo ou areia, o que reduziu a produtividade. Lourenço acredita que o prejuízo da família chegue a R$ 2 milhões. Para retomar as atividades, vendeu máquinas para fazer caixa e fez novos financiamentos, gerando um endividamento de R$ 1,5 milhão.

“A dívida só não é maior porque decidimos não reconstruir tudo, como o galpão de suínos e a sala de ordenha do gado de leite não foi feita”, conta Lourenço. “Optamos por só fazer lavoura, porque mais simples e barato para recomeçar”.

Mesmo essa alternativa de recomeço está difícil. Com a qualidade do solo reduzida e a seca que ocorreu no verão, a soja não se desenvolveu — as plantas morreram ou geraram vagens sem grãos. A colheita, que era de 60 sacas por hectare em anos normais, foi de apenas 22 sacas por hectare neste ciclo. Em algumas áreas, o rendimento é de apenas quatro sacas.

“Antes a gente tinha expectativa de conseguir um faturamento líquido de R$ 200 mil com a safra. Mas o resultado foi uma conta negativa de R$ 130 mil”, lamenta.

Após cinco anos com safras perdidas devido às secas e às enchentes, ele teme que tenha que deixar a agricultura. “Se tiver um sexto ano com safra desastrosa, quanto mais insistir na atividade, pior fica a situação. Não defini ainda o que fazer se isso acontecer”.

Nova atividade

No município de Travesseiro, a família Kunz teve um prejuízo de cerca de R$ 15 milhões quando a granja de suínos que possuíam desde 1982 foi destruída pelas águas do Rio Forqueta. A estrutura inteira se transformou em uma coleção de ferros retorcidos, pedaços de muros, lama e troncos de árvores. Mais de 4 mil animais morreram na granja com a enchente.

Assim como Lourenço Caneppele em Roca Sales, o produtor Eduardo Kunz decidiu que o melhor seria não retomar as atividades. As estruturas destruídas estão sendo removidas e o terreno vai ser transformado em lavoura. “Aqui não tem como continuar com suinocultura. A parte baixa do terreno é inundável, e a parte alta tem risco de deslizamento. Nossa área ficou inviável”, comenta.

Além do risco, a decisão de Kunz de mudar de atividade também é econômica. “Fazer uma granja do nível que tínhamos é um investimento muito alto, impraticável para nós com as taxas de juros nos níveis que estão. Se começasse e viesse outra enchente, não teríamos como pagar. Pelo menos com a lavoura, se a água subir, perdemos apenas uma safra, tem mais chance de recuperar”, afirma.

Persistência

No município de Estrela, o nível Rio Taquari alcançou 32 metros no início de maio de 2024, um recorde — para efeito de comparação, considera-se inundação na cidade quando ele chega a 19 metros. No interior do município, uma das comunidades mais atingidas foi Arroio do Ouro. No local, embora muitas terras já estejam ocupadas por lavouras, vários terrenos têm casas destruídas ou desabitadas, com matagal crescendo onde antes havia plantações.

“Eu tinha 10 vizinhos aqui perto. Dois morreram na enchente, outros foram embora, e só vai ficar eu e outro morador”, lamenta o produtor Airton José Dieter. “As terras aqui perto do rio não valem mais nada. Antes um hectare custava R$ 60 mil. Agora, um vizinho foi embora e vendeu a propriedade por R$ 20 mil por hectare”.

Em maio de 2024, Airton e a esposa, Anastácia, refugiaram-se com outros vizinhos no segundo andar de sua casa. O resgate do grupo, de barco, ocorreu após dois dias e uma noite no local.

A enchente fez com que os 40 hectares de Dieter tivessem o solo arrancado, restando apenas uma terra mais dura e pedregosa, ou os cobriu com lama e areia que ficava no fundo do rio. Os galpões foram destruídos e as máquinas agrícolas inutilizadas. As águas também mataram 50 bovinos e oito búfalos. “Hoje, eu só tenho cinco bois, que ganhei como doação”, diz.

Dieter recebeu a reportagem em uma cadeira de rodas, recuperando-se de um acidente que teve na colheita de milho que causou fratura exposta na perna esquerda. O incidente prejudicou ainda mais os planos do produtor, que até agora só conseguiu limpar 14 hectares de sua propriedade para plantio.

No entanto, devido à seca no verão e à redução na qualidade do solo, mesmo as lavouras que foram estabelecidas não ajudaram com as finanças. “Consegui colher só 25 sacos de soja por hectare. Vamos ver se no próximo ano melhora para. Senão vai ser cada vez pior”.

Apesar das dificuldades, Dieter não pensa em desistir da agricultura. “Com 12 anos de idade, meu pai me colocou em cima de uma colheitadeira, e agora vou fazer 60 anos. Nasci na roça, não sei fazer outra coisa. Tenho que insistir”.

Fonte: Globo Rural