
Por Ana Lúcia da Silva Corrêa Lemos, pesquisadora do Instituto de Tecnologia de Alimentos (Ital-Apta)
O consumo mundial de carne de aves, principalmente frango, tem apresentado um crescimento constante e significativo nas últimas décadas, com projeções indicando que essa tendência se manterá até 2030, tornando o frango a carne mais consumida globalmente.
A produção de carne de aves gera grandes quantidades de subprodutos que podem ser consumidos ou utilizados como ingredientes alimentares, como o fígado, que constitui de 1,6% a 2,3% do peso vivo do frango (Ockerman e Basu, 2004) e, considerando o rendimento de 65%, atinge cerca de 3% das carcaças comercializadas.
Uma das vísceras e subprodutos comestíveis de frango mais consumidos e nutritivos, o fígado possui um teor proteico semelhante ao do músculo (~20%) e também é uma rica fonte de minerais e vitaminas A e B12 (Ockerman e Basu, 2004).
Na culinária tradicional em todo o mundo, os fígados de frango são preparados e cozidos de diferentes maneiras, fritos, como patê e junto a outros ingredientes. Por outro lado, podem causar doenças devido às bactérias Campylobacter e Salmonella. Além da contaminação da superfície, há relatos de que Campylobacter presente internamente, no tecido dos fígados (Firlieyanti et al., 2016), o que dificultaria sua inativação completa durante o cozimento.
Portanto, o cozimento adequado do fígado de frango é essencial para obter um produto microbiologicamente seguro. O Serviço de Inspeção e Segurança Alimentar (FSIS) do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) recomenda seu cozimento até atingir uma temperatura interna de 73,9 °C (FSIS, 2020).
No entanto, a tendência em restaurantes e nos lares é cozinhar o fígado de forma insuficiente, para manter a cor rosada e as preferências de palatabilidade percebidas (Jones et al., 2016), pois o cozimento pode promover alterações indesejadas na qualidade, como enrijecimento e descoloração.
A maciez pode ser medida pela resistência ao cisalhamento instrumental, sendo um atributo sensorial determinante da qualidade da carne e da aceitação pelo consumidor. O cozimento em altas temperaturas frequentemente leva ao endurecimento, enquanto em baixas temperaturas, por um longo período, como no sous vide, melhora a maciez. A redução de área e a perda de massa durante o cozimento também são atributos sensoriais críticos, correlacionados com a suculência, a maciez e o rendimento do produto final.
Além dessas características de palatabilidade, o aquecimento altera a cor vermelha para rosa ou marrom opaco, impactando na atratividade visual da carne cozida. Os consumidores, incluindo chefs de cozinha, são mais propensos a avaliar o ponto adequado de cozimento pela cor.
A temperatura de armazenamento também afeta a qualidade da carne crua e cozida. Como a carne crua tem prazo de validade limitado, o armazenamento congelado é empregado para sua preservação. No entanto, o congelamento e o descongelamento podem alterar o teor de água das proteínas, afetando negativamente as qualidades da carne crua e após o cozimento.
A capacidade de retenção de água é o principal indicador de qualidade da carne crua, havendo relatos de sua redução pelo congelamento, armazenamento congelado e descongelamento. O armazenamento congelado, por sua vez, induz aumento da maciez e alterações de cor na carne crua, faltando estudos comparativos paralelos sobre as qualidades nutricionais da carne fresca e congelada após o cozimento. Pesquisas limitadas relataram alterações na qualidade de fígados cozidos: as perdas de peso no cozimento se assemelham às da carne (Hadi, 2020), variando de 26% a 34% no fígado de frango cru fresco quando diferentes condições de cozimento foram aplicadas.
Veja a matéria completa:











