
Na madrugada de uma sexta-feira em Bruxelas, após um jantar informal entre líderes europeus, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, anunciou uma proposta ousada: unir a União Europeia aos países do bloco da Parceria Transpacífica (CPTPP) para redesenhar a ordem comercial global — sem a necessidade de envolver diretamente os Estados Unidos. A iniciativa surge como resposta à política comercial agressiva e imprevisível do ex-presidente Donald Trump, que abalou o sistema multilateral de comércio, ao impor tarifas e questionar as regras da Organização Mundial do Comércio (OMC).
A proposta de criar uma nova plataforma de livre comércio baseada em regras — agora com a presença do Reino Unido no CPTPP — aponta para uma reorganização do poder global no comércio internacional. E, embora essa movimentação tenha sido motivada principalmente por tensões entre EUA e Europa, ela abre uma janela de oportunidades que o Brasil não pode ignorar.
Por que o Brasil deve prestar atenção?
O Brasil, embora não faça parte do CPTPP nem da União Europeia, é uma potência agrícola e industrial com fortes laços comerciais com ambas as regiões. Em tempos de fragmentação da ordem multilateral tradicional, o surgimento de uma nova coalizão baseada em regras oferece ao país a chance de repensar sua estratégia de inserção internacional. Uma possível aproximação com esse novo arranjo poderia fortalecer a posição do Brasil como fornecedor estratégico de alimentos, minerais e energia limpa.
Além disso, o Brasil tem buscado ampliar sua participação em acordos comerciais plurilaterais, sobretudo após o avanço do Acordo Mercosul-União Europeia (ainda pendente de ratificação). O movimento liderado por von der Leyen revela que os europeus estão abertos a novas formas de articulação — inclusive fora da OMC — para enfrentar os desafios do comércio global e evitar a dependência de atores voláteis.
Um novo eixo: Europa–Ásia–Pacífico?
Ao combinar o peso econômico da União Europeia com o dinamismo dos países do CPTPP (como Japão, Austrália, Vietnã, Canadá e agora o Reino Unido), a proposta sinaliza a formação de um novo eixo de poder global no comércio. Essa coalizão — sem a presença automática dos Estados Unidos — poderia se tornar um polo alternativo ao protecionismo e às tensões geopolíticas sino-americanas.
O Brasil, caso consiga deixar de se posicionar ideologicamente e retornar a sua tradição diplomática de buscar o equilíbrio e a multipolaridade, tem condições de se posicionar como parceiro confiável nesse novo cenário. Além disso, ao mostrar interesse em participar, se possível, como “observador” ou mesmo como “futuro associado”, o país poderia defender seus interesses de forma mais assertiva e propositiva.
Conclusão: uma chance de liderar com pragmatismo
O momento é delicado, mas também repleto de oportunidades. O Brasil precisa olhar com atenção para essa nova proposta de von der Leyen, compreendendo que o mundo caminha para uma reconfiguração de alianças econômicas. Permanecer à margem dessas iniciativas, como tem feito em diferentes temas, pode significar mais isolamento. Participar, mesmo que de forma indireta ou como parceiro estratégico, pode ser o diferencial para garantir acesso a mercados, estabilidade comercial e influência nas regras do jogo.
O Brasil não pode apenas reagir — precisa agir. Com diplomacia, visão estratégica e firmeza, pode encontrar seu lugar neste novo tabuleiro global.
Por Jogi Humberto Oshiai, CBO da Melo Advogados e Diretor da Oshiai Consultoria e Assessoria Ltda, diretamente de Bruxelas, capital da União Europeia especialmente para a Avicultura Industrial